16 anos de prisão: Sexta Turma do STJ anula condenação por suposto homicídio cometido no exercício da função imposta a policial militar há 05 anos; vídeo

Ex-policial, que perdeu o cargo em razão da condenação, foi considerado culpado pelo tribunal do júri apenas com base em elementos de informação colhidos durante inquérito
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A Sexta Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) anulou um processo que resultou na condenação à 16 anos de reclusão imposta a um policial militar condenado pelo tribunal do júri em 2017. O fato teria ocorrido em 2001, tendo o processo transitado em julgado em 2018

No STJ, o julgamento começou com um voto desfavorável do relator, ministro Antonio Saldanha Palheiro, que ponderou que a matéria não poderia ser analisada pela Corte, visto que a discordância contra a decisão de pronúncia foi levantada apenas na revisão criminal, demonstrando, assim, que a matéria estaria preclusa.

Ao analisar o mérito, Saldanha também ponderou que o conhecimento do habeas corpus implicaria em revolvimento do acervo fático-probatório, providência vedada na angusta via do remédio constitucional, marcada pela celeridade e pela sumariedade na cognição.

A divergência aberta pelo ministro Rogério Schietti

O ministro Rogério Schietti não concordou com as conclusões do relator e abriu divergência.

Inicialmente, o ministro destacou o fato de a pronúncia ter se alicerçado apenas em elemento de informação constante em um testemunho colhido durante o inquérito policial, o que confronta o entendimento consolidado pelas duas Turmas criminais do STJ.

Em um Estado Democrático de Direito, a ausência de qualidade probatória no contraditório é inválida para sustentação de qualquer convencimento contra o réu, seja para condená-lo, seja para– nos crimes dolosos contra a vida – pronunciá-lo e submetê-lo a julgamento pelo Tribunal do Júri, no qual, enfatize-se, o veredito é alcançado sem explicitação de motivos pelos juízes populares, o que incrementa o risco de condenações sem o necessário lastro em provas colhidas sob o contraditório judicial, pontuou o ministro.

Por esse motivo, devem-se submeter a julgamento do Tribunal Popular somente os casos em que se verifiquem a comprovação da materialidade e a existência de indícios suficientes de autoria, nos termos do art. 413, § 1º, do CPP. Dessarte, a primeira fase do procedimento bifásico do Tribunal do Júri exige prévia instrução, sob o crivo do contraditório e com a garantia da ampla defesa, perante o juiz togado, destacou.

O ministro também aproveitou para pontuar a diferença entre elementos de informação e prova. Saliento, por oportuno, que elementos informativos não se confundem com provas. Essas são produzidas com a observância do contraditório em juízo, que serve como condição de sua existência e de sua validade, assegurado o direito de ampla defesa. Aqueles, por sua vez, são produzidos na fase investigatória, sem a necessária participação dialética das partes. Por esse motivo, elementos de informação não podem, isoladamente, subsidiar um juízo positivo de admissibilidade no caso do Tribunal do Júri, tampouco uma condenação.

Sobre a pronúncia do policial, Rogério Schietti advertiu que os indícios de autoria foram extraídos tão somente de depoimento de testemunha prestado no inquérito policial, tendo o réu, em seu interrogatório, negado as imputações.

Além disso, observou o ministro, em plenário, nenhuma testemunha foi ouvida, a se concluir que, tal qual a decisão de pronúncia, a condenação foi fundada apenas em elementos de informação.

Portanto, in casu, não havia prova idônea para fundamentar a decisão dos jurados, porquanto nada foi produzido em juízo, sob o crivo do contraditório, para sustentar a versão acusatória, arrematou.

Aplicação retroativa do entendimento jurisprudencial

Tendo em vista que a jurisprudência do STJ no sentido de que elementos de informação colhidos durante a fase inquisitorial não podem, por si sós, alicerçar decisões de pronúncia foi firmada após a condenação, pairou sobre o julgamento uma discussão acerca da (im)possibilidade de aplicação retroativa do entendimento para favorecer o paciente.

Sobre o tema, Schietti pontuou que a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça entende ser possível a aplicação retroativa de jurisprudência mais benéfica ao réu, desde que o novo entendimento seja pacífico e relevante:

"Cabível o manejo da revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP em situações nas quais se pleiteia a adoção de novo entendimento jurisprudencial mais benigno, desde que a mudança jurisprudencial corresponda a um novo entendimento pacífico e relevante" (RvCr n. 3.900/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, 3ª S., DJe 15/12/2017).

Mais recentemente, com o julgamento em 13/10/2021, da RvCr. 5.627/DF, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, DJe 22/10/2021, a Terceira Seção reafirmou ser “Cabível o manejo da revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP em situações nas quais se pleiteia a adoção de novo entendimento jurisprudencial mais benigno, desde que a mudança jurisprudencial corresponda a um novo entendimento pacífico e relevante, observou o ministro.

A defesa ajuizou revisão criminal e, mesmo após firmado esse entendimento, a Corte estadual não observou a jurisprudência desta Corte Superior acerca o tema em discussão. Ressalto a inexistência de provas judicializadas sobre a autoria não apenas para respaldar a decisão que encerrou a fase de admissibilidade da acusação, como também a condenação. Portanto, no presente caso, deve-se não apenas desconstituir o julgamento pelo Conselho de Sentença como também anularo processo desde a decisão de pronúncia – pois não havia como submeter o ora agravante ao Tribunal do Júri com base em uma declaração colhida no inquérito policial e não corroborada em juízo – e, por conseguinte, impronunciar o acusado.

Número da decisão: AgRg no HABEAS CORPUS Nº 731.882 – AM.

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