
A confissão exigida para a celebração do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) é estritamente pessoal e não pode ser condicionada à delação de corréus.
Foi o que decidiu o ministro Antonio Saldanha Palheiro, da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao cassar uma decisão da justiça de São Paulo que havia negado a homologação de um acordo de não persecução penal sob o fundamento de que o imputado não teria relatado a participação do “comparsa” no furto investigado.
🤔 O que aconteceu
O caso envolveu um acusado que foi preso em flagrante pela suposta prática do delito previsto no art. 155, §4º, I e IV do Código Penal (furto qualificado mediante rompimento de obstáculo e concurso de pessoas).
- Após a concessão de liberdade provisória em audiência de custódia, o Ministério Público, em vez de denunciar o acusado, ofereceu-lhe proposta de acordo de não persecução penal.
- Contudo, o juízo de primeiro grau não homologou o acordo sob a justificativa de que o acusado “não confessou formal e circunstancialmente todos os fatos”, pois teria apresentado apenas uma “confissão parcial” ao não relatar a participação dos corréus no crime.
- O Tribunal de Justiça de São Paulo, por maioria, manteve a decisão, entendendo que a “confissão formal e circunstancialmente” exigida pela lei seria “aquela que é efetivada de forma detalhada, completa, com as particularidades da ação delituosa, inclusive com relato sobre a participação dos coautores na prática do crime”.
👨⚖️ O que o ministro decidiu
O Ministro Antonio Saldanha Palheiro acolheu o argumento da Defensoria Pública e do Ministério Público Federal (que opinou pela concessão da ordem) no sentido de que a confissão exigida para o ANPP não se confunde com a delação de corréus.
- O relator destacou que, sempre que o ordenamento jurídico brasileiro quis exigir a delação de coautores como requisito para a concessão de algum benefício, o fez expressamente, como ocorre na Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850/13), na Lei de Crimes Hediondos e no artigo 159, §4º, do Código Penal (extorsão mediante sequestro).
- Na decisão, o ministro enfatizou que os institutos do ANPP e da delação premiada têm finalidades distintas: enquanto o primeiro busca abreviar o processo penal, o segundo visa justamente o contrário, potencializando a persecução penal.
- Assim, “a exigência de delação pode mesmo inviabilizar a finalidade da lei, eis que o receio de retaliação por parte dos demais agentes criminosos poderia desestimular aquele com intenção de confessar”.
- Em sua fundamentação, o ministro lembrou ainda que os acusados foram todos presos em flagrante, estando as condutas já bem delineadas na denúncia, que não apontou a existência de estrutura organizada, mas mero concurso de agentes.
- Nesse contexto, a exigência de delação constituiria “mero formalismo, sem nada a acrescentar de relevante aos interesses do Estado”.
Por essas razões, Saldanha concedeu a ordem para homologar o acordo de não persecução penal proposto pelo Ministério Público de São Paulo e aceito pelo acusado.
Referência: Habeas Corpus 714507.