Estelionato: fato de vítima registrar boletim de ocorrência, por si só, não basta para demonstrar vontade de representar

Ministro André Mendonça considerou que a presença da vítima na delegacia e o registro de boletim de ocorrência não bastariam para demonstrar vontade de representar
Foto: Carlos Moura/SCO/STF

O ministro André Mendonça, da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu que o registro de boletim de ocorrência perante a autoridade policial não é suficiente para revelar, de maneira inequívoca, a vontade da vítima de representar criminalmente contra suspeito por estelionato.

No caso dos autos, o juízo a quo rechaçou a arguição de nulidade da defesa por considerar que a vítima teria demonstrado a vontade em ver o suposto autor do estelionato processado criminalmente ao comparecer à delegacia para registrar o boletim de ocorrência. No STJ, o entendimento foi endossado sob o argumento de que embora a vítima não tenha representado formalmente, “dirigiu-se até a Delegacia e narrou o episódio à Autoridade Policial, evidenciado de modo inequívoco a sua vontade de ver o autor do crime processado criminalmente”.

Para o ministro André Mendonça, no entanto, o mero registro de boletim de ocorrência não bastaria para demonstrar a vontade da vítima. Para Mendonça, embora a jurisprudência da Segunda Turma do STF tenha se orientado no sentido de ser dispensável formalidade maior para a representação no eselionato, a relevância necessária à caracterização da vontade encontraria-se no conteúdo, e não na forma documental pela qual externada a manifestação.

“Muito embora esta Corte tenha firmado entendimento de que a representação da vítima, em crimes de ação penal pública condicionada, dispensa protocolo específico, permitindo-se sua inferência a partir, por exemplo, do relato constante do boletim de ocorrência ou de termo de declaração prestado na fase policial, o que importa é saber se a partir desses documentos consta a efetiva demonstração de vontade inequívoca de que se tenha o processamento do autor do crime”, pontuou.

“Neste cenário, considerando que não houve aferição, a partir do teor do boletim de ocorrência e do termo de declarações, se restou evidenciada, de maneira inequívoca, a vontade expressa de ver o recorrente processado criminalmente, para apontar o simples registro do fato na delegacia como suficiente para tal finalidade, entendo não restar demonstrado o preenchimento da condição de procedibilidade da ação penal na hipótese”, destacou o relator.

O ministro ressaltou, não obstante, que seria inviável o reconhecimento imediato da decadência sem a prévia intimação da vítima, nos termos do que a Segunda Turma vem decidindo.

Assim, ele concedeu a ordem para determinar que o juízo de primeira instância proceda à valoração do teor do boletim de ocorrência, a fim de aferir a existência de vontade inequívoca em representar contra o acusado. Em caso de inexistência de vontade inequívoca, o relator determinou a intimação da vítima.

Número: RHC 216272.

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