Em decisão importantíssima, Quinta Turma reconhece quebra da cadeia de custódia de vídeo utilizado para demonstrar suposto dolo eventual do acusado

Ao reconhecer a nulidade da prova, a Turma também aplicou o regramento da cadeia de custódia de forma retroativa, já que o caso é anterior ao pacote anticrime
Imagem: reprodução Youtube STJ.

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça despronunciou um acusado após reconhecer a nulidade dos vídeos utilizados para sustentar o suposto dolo eventual. A decisão, tomada por maioria apertada de votos, reconheceu a quebra da cadeia de custódia no caso por ausência de documentação mínima sobre a extração, preservação e tratamento técnico das imagens.

🤔 O que aconteceu?

O acusado foi pronunciado por homicídio doloso e lesão corporal em razão de um acidente de trânsito ocorrido em 2013. Para sustentar a tese de dolo eventual, o Ministério Público se apoiou em vídeos extraídos de câmeras de segurança de uma rua e de um posto de combustível.

No caso, os próprios proprietários do estabelecimento entregaram as referidas filmagens à autoridade policial, inexistindo, assim, certeza de que a extração foi feita de forma adequada. 

Desde o início do processo, a defesa questionou a idoneidade das filmagens e requereu perícia para apurar eventuais edições nos arquivos. Também apontou a inexistência de documentos básicos que comprovassem a cadeia de custódia das mídias, como autos de apreensão, requisições oficiais, fichas de acompanhamento de vestígios e registros técnicos da coleta e do armazenamento.

As respostas fornecidas pelas autoridades confirmaram a ausência desses documentos. O Instituto de Polícia Científica da Paraíba reconheceu que a ficha de acompanhamento de vestígios não era produzida à época dos fatos. Já a delegacia responsável afirmou não saber como as mídias foram acondicionadas ou tramitadas. A defesa ainda destacou que os vídeos não continham nem mesmo a data da suposta gravação.

📃 O que o STJ decidiu 

Por empate na votação, prevaleceu a posição mais favorável ao réu, com a Ministra Daniela Teixeira lavrando o acórdão. Em seu voto, a Ministra destacou que “a cadeia de custódia visa garantir que os vestígios de uma infração penal correspondam exatamente àqueles arrecadados pela polícia, examinados e apresentados em juízo, assegurando sua integridade.”

A decisão estabeleceu que “a ausência de documentação dos atos realizados no tratamento das provas compromete sua confiabilidade, não sendo possível presumir a veracidade das alegações estatais sem o cumprimento dos procedimentos referentes à cadeia de custódia.

O Tribunal reconheceu que, embora as regras específicas sobre cadeia de custódia tenham sido introduzidas pela Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime), a necessidade de preservação da integridade probatória não surgiu apenas com essa legislação, sendo “logicamente indissociável do próprio conceito de corpo de delito” já previsto no Código de Processo Penal em sua redação original.

“A quebra da cadeia de custódia torna inadmissíveis as provas extraídas, bem como as provas delas derivadas, em aplicação analógica do art. 157, § 1º, do CPP”, afirmou a Ministra Daniela Teixeira na decisão.

💡 A tese fixada

O tribunal estabeleceu a seguinte tese de julgamento:

“1. A cadeia de custódia deve ser preservada para garantir a integridade e fidedignidade das provas.

2. A quebra da cadeia de custódia torna inadmissíveis as provas e suas derivadas.

3. A aplicação retroativa do regramento da cadeia de custódia é necessária para assegurar a legalidade e objetividade do processo penal”.

Referência: AgRg no HC 901602.

Clique aqui para acessar a íntegra do acórdão.

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