
Em decisão unânime, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça reafirmou que a simples embriaguez do condutor não é suficiente, por si só, para justificar a imputação de homicídio com dolo eventual em casos de acidente de trânsito com resultado morte. O colegiado deu provimento a recurso da defesa e desclassificou a conduta imputada a um motorista de homicídio doloso qualificado para homicídio culposo na direção de veículo automotor.
O caso envolveu um grave acidente ocorrido em Capivari (SP), no qual um motociclista morreu após ser atingido por um carro conduzido por motorista que apresentava sinais evidentes de embriaguez.
A denúncia imputava ao acusado a prática de homicídio doloso com qualificadoras, com base exclusiva no fato de ele estar embriagado no momento da colisão. Para a defesa, não havia outros elementos capazes de demonstrar a assunção do risco do resultado morte, sendo a via do dolo eventual juridicamente inadequada à descrição fática apresentada.
O que decidiu o STJ
No julgamento do Recurso em Habeas Corpus n. 208.285/SP, o ministro Otávio de Almeida Toledo, relator do caso, acolheu o argumento da defesa ao afirmar que “a embriaguez, isoladamente, não caracteriza dolo eventual em acidente de trânsito com resultado morte”. Para ele, não havia, na denúncia, qualquer circunstância adicional que justificasse a imputação dolosa, como excesso de velocidade, direção temerária ou desrespeito a outras normas de trânsito.
O ministro destacou que a desclassificação para a modalidade culposa pode ser realizada, de forma excepcional, já na fase de resposta à acusação, desde que a questão envolva exclusivamente matéria de direito, como no caso analisado. Segundo o voto, “não se pode simplesmente presumir o dolo eventual, sujeitando o acusado ao procedimento do júri, se a própria moldura fática da acusação não fornece elementos concretos que sustentem essa capitulação”.
Ao final, a Turma reconheceu a inviabilidade da imputação dolosa nas circunstâncias narradas e determinou a desclassificação da conduta para o delito previsto no art. 302, §3º, do Código de Trânsito Brasileiro, com a remessa dos autos ao juízo competente.
Teses fixadas
O STJ estabeleceu duas teses no julgamento:
- A embriaguez, isoladamente, não caracteriza dolo eventual em acidente de trânsito com resultado morte; e
- A desclassificação para homicídio culposo é cabível na fase de análise da resposta à acusação quando a discussão não envolve questionamento fático e impacta na competência para o processamento do feito.
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