O ditado popular “para toda regra existe uma exceção” revela um padrão de qualquer dispositivo responsável por prescrever regras ou normas que objetivem a regulação de qualquer interação humana no Brasil.
No Direito, inclusive, parece ter se convencionado que os dispositivos legais devem possuir mais exceções do que regras, ao passo que desconhecer as exceções, no plano prático, equivale a ser um completo ignorante em várias matérias
Na suspensão condicional do processo isso também ocorre, e dominar a matéria pode ser importante para impedir que uma ação penal continue a tramitar, gerando incontáveis consequências para o imputado.
De maneira bem rápida, portanto, gostaríamos de abordar duas situações que excepcionam a principal regra do chamado sursis processual, qual seja, a necessidade da pena mínima da infração penal ser inferior a 01 ano.
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sUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO: PRIMEIRA EXCEÇÃO
A primeira situação que excepciona a regra da pena mínima inferior a um ano na suspensão condicional do processo é da cominação alternativa de pena multa no tipo penal, independente do patamar de pena corporal previsto.
A princípio, parece oportuno utilizarmos um belíssimo trecho da conclusão que chegou o ex-ministro Cezar Peluso em Habeas Corpus que trata especificamente da questão ora abordada:
Se a pena privativa de liberdade de um ano dá direito à suspensão condicional de processo, a pena de multa, que é muito menos grave, também (HC 83.926/RJ).
Na oportunidade, o Supremo Tribunal Federal debruçou-se sobre uma ação penal movida em face de um réu acusado de vender mercadorias impróprias para consumo.
É de se lembrar que conforme o artigo 7º, inciso IX, da Lei 8.137, vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo é crime passível de reprimenda que pode variar de 02 a 05 anos de detenção, ou multa.
Assim, no caso em comento, recebida a denúncia, a defesa requereu a aplicação da suspensão condicional do processo, nos termos do artigo 89 da Lei 9.099/99, tendo o Ministério Público se recusado a oferecer o benefício em decorrência do patamar de pena corporal previsto para o tipo.
O caso, então, chegou ao Supremo e a relatoria ficou a cargo do ex-ministro. Cesar Peluso, que na oportunidade ressaltou que apesar da pena mínima de 02 anos de detenção, a menor reprimenda prevista pelo legislador para o tipo foi a de multa, que poderia ser aplicada de maneira alternativa.
Assim, a Corte assentou que se prevista, alternativamente, a pena de multa, tem-se por satisfeito um dos requisitos legais para a admissibilidade de suspensão condicional do processo.
É de observar, no entanto, que o STF, em casos parecidos e com pena máxima menor que a do caso anterior, inclusive, já denegou a ordem, ressaltando o fato da pena do crime ser acima de 02 anos deixaria evidenciado uma vontade do legislador de não aplicar ao tipo o caráter de “crime de menor potencial ofensivo”, como podemos inferir, por exemplo, do HC 112.758 / TO, de relatoria do ministro Ricardo Lewandowski.
De qualquer forma, a previsão alternativa de multa ainda tem sido aceita como atributo suficiente a ensejar a superação do patamar de pena mínima exigido pelo artigo 89 da Lei 9.099.
SEGUNDA EXCEÇÃO
A segunda exceção é um pouco mais difundida e encontra-se cristalizada na Súmula 337 do STJ, que prevê o cabimento da suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva.
Em alguns casos, pode acontecer de o réu ser denunciado por um crime que não admita a suspensão condicional do processo e, posteriormente, acabar advindo a desclassificação (ou uma condenação parcial) que faça com que o patamar de pena mínima passe a ser inferior a 01 ano.
É o que acontece, por exemplo, quando temos a desclassificação da tentativa de homicídio para lesão corporal grave.
A jurisprudência, inclusive, admite que a suspensão condicional do processo possa ser oferecida quando a desclassificação ocorre em uma instância superior
Assim, temos que a pena mínima não superior a 01 ano é a regra para a aplicação da suspensão condicional do processo, mas que devemos nos atentar para duas exceções importantíssimas.