A 12ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deu provimento a uma apelação criminal para absolver um réu acusado pelo crime de furto. Para a Câmara, a impressão digital do réu na embalagem encontrada na casa da vítima, única prova do processo, era insuficiente para condenar, visto que o contato do acusado com o material poderia ter se dado antes da sua aquisição pela vítima.
A manifestação inconstitucional do Ministério Público no parecer
Inicialmente, a Câmara rechaçou a afirmação feita pela Procuradoria de Justiça no sentido de que “o silêncio é incompatível com o estado de inocência do acusado”.
Ao rebater a afirmação inacreditável, pontuou o Colegiado que o silêncio do réu “trata-se de efetiva faculdade do acusado consagrada pela Lex Magna, de modo que qualquer entendimento diferente acerca de sua não manifestação quanto aos fatos é mera suposição e, portanto, inadmissível pelo direito”.
A decisão
Agora, vejamos o que decidiu a Câmara ao concluir pela absolvição do apelante:
A prova…
“No mais, é certo que a única prova que pesa contra o acusado é o laudo papiloscópico de fls. 05/16, que constatou um fragmento de impressão digital em uma “caixa branca Ipad, dormitório de solteiro”, que coincide com o datilograma de José Alexandre da Silva Ferreira. Nada mais!
De rigor anotar que o objeto que continha uma marca de impressão datiloscópica não é algo fixo na residência, como uma maçaneta ou corrimão, por exemplo. Ao contrário. Trata-se de uma caixa de aparelho eletrônico Ipad -, não podendo ser descartada a hipótese de ter sido manuseada pelo réu, quando ainda se encontrava exposta à venda. Aliás, algo muito comum de se ocorrer. Assim, o encontro de impressão digital do acusado em uma embalagem de produto eletrônico não pode ser, por si só, prova de que o acusado tenha adentrado na residência da vítima. Tampouco que tenha sido ele o autor do furto.”
A ausência de outras provas…
“No mais, consigno que após o encontro da impressão digital do acusado na embalagem do Ipad, não se prosseguiu nas investigações, de forma que não se produziu qualquer outra prova em desfavor do acusado ou mesmo a indicar a autoria em relação a outra pessoa.”
A fragilidade do conjunto probatório
“O conjunto probatório produzido pela Acusação é demasiadamente frágil para amparar um decreto condenatório. Não restou demonstrada a contento a autoria em desfavor de (nome do acusado).
Dessa forma, a absolvição, frente à insuficiência de provas, é de rigor. Pertinentes as sábias palavras de Aury Lopes Jr.:
Ao lado da presunção de inocência, como critério pragmático da solução da incerteza (dúvida) judicial, o princípio do in dubio pro reo corrobora a atribuição da carga probatória ao acusador e reforça a regra de julgamento (não condenar o réu sem que sua culpabilidade tenha sido suficientemente demonstrada). A única certeza exigida pelo processo penal refere-se à prova da autoria e da materialidade, necessária para que se prolate uma sentença condenatória. Do contrário, em não sendo alcançado esse grau de convencimento (e liberação de cargas), a absolvição é imperativa. (Direito Processual Penal, 9ª Edição, 2012, Editora Saraiva, pág. 550).
A presunção de inocência…
“Assim, como cediço, o status libertatis é a regra e a inocência presumida. A restrição a qualquer direito, entre os quais a liberdade, sempre deve ser precedida do devido processo legal, com todas as garantias que lhe são inerentes, em particular à vista do contraditório e decisão fundamentada. Em outras palavras, o acusado é sempre inocente até prova inequívoca em sentido contrário, analisada por sentença e após seu trânsito em julgado. E prova inequívoca, nesse caso, não há.”
Número: Apelação Criminal nº 1518636-86.2020.8.26.0050.