O Conselho Nacional do Ministério Público publicou nesta quinta (25) a Resolução 289/2024, que adéqua as Resoluções CNMP 181/2017 e 36/2009 à Lei 13.964/19 (Pacote Anticrime). O documento regula alguns temas importantes, como a instauração e a tramitação de investigações pelo MP, a utilização de interceptação telefônica e o acordo de não persecução penal.
Um aspecto problemático da Resolução está no capítulo II do documento, que prevê que “havendo descumprimento de qualquer das condições do acordo, a denúncia a ser oferecida poderá utilizar como suporte probatório a confissão formal e circunstanciada do investigado, prestada voluntariamente na celebração do acordo”.
Assentou o órgão de controle do Ministério Público, de forma problemática, que a confissão prestada para fins de celebração do acordo de não persecução penal poderá ser utilizada para condenar o imputado em caso de rescisão do acordo.
O valor da confissão em caso de rescisão do acordo já vinha sendo discutido pela doutrina e em algum momento teria que ser enfrentado na prática. Parece que esse momento chegou. O STJ e o Supremo terão que se posicionar.
Necessário lembrar que o Plenário do Supremo está para apreciar esse tema desde 2020, quando o ministro Gilmar Mendes destacou o Habeas Corpus 185913.
A utilização da confissão em desfavor do imputado gera alguns problemas. Aqui, cito três:
1) O primeiro e mais óbvio é ofensa ao princípio do nemo tenetur se detegere, já que o direito de não produzir provas contra si é uma garantia individual inerente a qualquer indivíduo. Não sendo a confissão voluntária, há um vício insanável que contamina eventual validade como elemento de informação/prova.
2) A ofensa ao princípio da legalidade: o acordo de não persecução penal foi amplamente discutido pelo legislador, que não previu a hipótese de utilização na denúncia/sentença. A confissão, nos moldes do que foi regulado pelo Legislativo, é mera formalidade para a celebração do acordo. Não pode o CNPM, através de uma resolução, tentar mudar (ou ampliar isso).
3) Além desses aspectos, ainda há um outro de ordem prática: o ANPP não é como a colaboração premiada, em que o Estado tem interesse naquilo que o colaborador tem a dizer. Na colaboração há verdadeira negociação (ambas as partes tem a ganhar e a perder).
No ANPP, não. Nele, só o imputado tem a perder, o que implica no risco real de confissões falsas prestadas só pelo receio de uma eventual denúncia.
Preocupante. Aguardemos as cenas dos próximos capítulos.