Picture of Hebert Freitas
Hebert Freitas
Hebert Freitas é coordenador do Síntese Criminal e advogado pela Universidade Federal Fluminense. Siga no Twitter/X: @freitashebert_

Violência no acordo de não persecução penal: cuidado!

Sabe-se que a violência impede o oferecimento do acordo de não persecução penal, mas essa regra possui exceções importantes. Nesse artigo, trazemos todas elas para você.

O caput do artigo 28-A, do Código de Processo Penal, prevê que o Ministério Público poderá propor o acordo de não persecução penal se o investigado confessar formal e circunstancialmente a prática de infração penal praticada sem violência ou grave ameaça. 

Sobre a polêmica confissão, já fizemos um artigo completíssimo que você pode ler ao clicar aqui.

O que trataremos aqui, hoje, é do conceito de violência adotado pelo legislador, tendo em vista a diferença considerável existente entre um ato violento e uma violência gerada por um ato.

Explicamos.

Imagine as seguintes situações:

  1. A, com a intenção de causar um injusto grave a B, desfere contra este vários golpes com uma barra de metal, causando lesões gravíssimas.
  2. C, por imprudência na direção de um veículo automotor, atropela D, que vem a sofrer lesões gravíssimas.

Note que a violência está presente nas duas situações, mas só foi intencional (dolosa) na primeira, onde A desejava causar um mal a B, vindo a obter êxito em satisfazer sua vontade a partir dos seguidos golpes de barra de metal.

Assim, surge uma indagação importante: será que o indivíduo C (da segunda situação) estaria impedido ou não de celebrar um acordo de não persecução penal de acordo com a previsão constante do caput do artigo 28-A?

É o que vamos, de maneira breve, tentar responder aqui.

Parece não haver muita discordância no sentido de ser, sim, possível, o oferecimento do acordo de não persecução nos crimes culposos com resultado violento.

Segundo Renato Brasileiro, a violência ou grave ameaça aí citada necessariamente deverá ter sido praticada a título doloso, daí po que há de se admitir a celebração do acordo na hipótese de eventual crime culposo com resultado violento (lesão corporal culposa).

Assim, a violência que obsta o oferecimento do acordo de não persecução deveria ser aquela praticada a título de dolo, estando presente, portanto, na conduta, e não no resultado.

A posição é endossada por Rogério Sanches, que apregoa: “para nós, a violência que impede o ajuste é aquela presente na conduta, e não no resultado. Logo, homicídio culposo, por exemplo, admite o ANPP”.

É essa, inclusive, a posição do próprio Ministério Público, senão vejamos:

ENUNCIADO 74 DO CAO-CRIM  “É cabível o acordo de não persecução penal nos crimes culposos com resultado violento, pois, nesses delitos, a violência não está na conduta, mas no resultado não querido ou não aceito pelo agente, incumbindo ao órgão de execução analisar as particularidades do caso concreto”. 

ENUNCIADO 23 DO CNPG E DO GNCCRIM “É cabível o acordo de não persecução penal nos crimes culposos com resultado violento, uma vez que nos delitos desta natureza a conduta consiste na violação de um dever de cuidado objetivo por negligência, imperícia ou imprudência, cujo resultado é involuntário, não desejado e nem aceito pela agente, apesar de previsível.” Sendo assim, por ora, a violência nos crimes culposos não é considerada para fins de óbice ao oferecimento do ANPP. 

Sendo assim, por ora, a violência nos crimes culposos não é considerada para fins de óbice ao oferecimento do ANPP.

A violência imprópria, em resumo, é aquela onde não há o emprego da violência tradicional (física), mas sim de um mecanismo capaz de reduzir o poder de reação da vítima, como é o caso do “boa noite cinderela”.

Aqui, a situação é diferente daquela relacionada ao crime culposo, pois a violência, ainda que imprópria, é praticada a título de dolo, sendo, portanto, incabível o acordo de não persecução penal.

O crime preterdoloso, na conceituação “popular”, é aquele onde há dolo no início da ação voluntária e culpa no resultado.

O exemplo perfeito para o crime preterdoloso é a lesão corporal qualificada pelo resultado morte, onde um indivíduo causa uma lesão intencional em outra e, sem querer, acaba causando sua morte 

Aqui, em tese, o acordo de não persecução penal também não poderá ser oferecido, pois ainda que o resultado do crime não tenha sido pretendido pelo agente, a lesão na lesão antecedente existiu uma “violência dolosa”.

Para Mauro Messias, a situação é diferente no abandono de incapaz qualificado pelo resultado morte, onde a violência reside exclusivamente no resultado culposo. Aqui, seria possível o oferecimento do ANPP.

Assim, temos que a violência ou a grave ameaça impedirá o oferecimento do acordo de não persecução, mas isso deve ser visto com cuidado.

Nos siga no Instagram, pois lá nós compartilhamos conteúdo de alta relevância sobre Direito Penal, Processo Penal, Direito Penal Militar, etc.

Nós também temos um canal exclusivo no Telegram, onde postamos documentos importantes dos processos criminais de relevância do país. Vale a pena dar uma conferida!

Leia também

plugins premium WordPress