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Hebert Freitas

Hebert Freitas é coordenador do Síntese Criminal e advogado pela Universidade Federal Fluminense. Siga no Twitter/X: @freitashebert_

Em recurso, Ministério Público afirma que habeas corpus concedido por ministro do STJ sem ouvir o órgão violou a ampla defesa

Em peça, subprocurador critica sistemática atual do habeas corpus nos tribunais superiores e afirma que decisão foi ilegal

Trecho do AgRg no HC 826815, interposto pelo MPF

O Ministério Público Federal afirmou em recurso que o ministro Jesuíno Rissato (desembargador convocado do TJDFT), que integra a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, violou a ampla defesa ao conceder um habeas corpus sem ouvir o órgão e sem solicitar informações à autoridade apontada como coatora.

Na peça, subprocurador tece diversas críticas sobre a sistemática do habeas corpus, mas nada diz sobre as graves violações a direitos fundamentais existentes no país.

O que aconteceu?

No dia 31.5.2023, o ministro, monocraticamente, revogou uma prisão preventiva decretada em desfavor de um homem supostamente flagrado pela polícia com 13,86 gramas de cocaína em São Paulo.

  • Na decisão, o magistrado de primeiro grau se limitou a tecer considerações genéricas sobre a suposta necessidade da prisão, o que contraria a jurisprudência pacífica do STJ, que exige fundamentação concreta. O decreto prisional foi mantido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

  • Ao constatar a ilegalidade da decisão, o ministro Jesuíno Rissato pontuou a quantidade pequena de drogas apreendidas e a suficiência das medidas cautelares diversas da prisão.

  • Ele concedeu a ordem para determinar a soltura do acusado.

A irresignação do Ministério Público Federal

Indignado com a decisão, o MPF interpôs agravo regimental (que foi, inclusive, negado pela Sexta Turma).

  • Na peça, o Subprocurador Francisco de Assis Sanseverino critica a sistemática atual do habeas corpus nos tribunais superiores e chega a afirmar que “há uma grave distorção no sistema em função da ampliação da utilização das hipóteses de cabimento, dos limites e possibilidade do HC”.

  • Sanseverino também afirma que admissão de habeas corpus substitutivo de recurso especial “tem inviabilizado a jurisdição em tempo hábil”, já que o STJ “recebeu inúmeros habeas corpus que, com raras exceções, não seriam classificados como originários”.

  • Sobre as decisões teratológicas proferidas por juízes e tribunais de justiça – desrespeitando jurisprudência consolidada do STJ, inclusive – , o subprocurador nada diz.

  • Mas não só: no recurso, o membro do MPF afirma que o tribunal, em habeas corpus, só pode ordenar que a autoridade coatora corrija a ilegalidade e profira outra decisão.

  • “O habeas corpus é ação mandamental. Assim, tem como finalidade principal a ordem (mandamento) para que a autoridade coatora corrija ato ilegal. Em outras palavras, a ordem deve, a um só tempo, cassar eventual ato ilegal e determinar que a autoridade coatora profira nova decisão”, disse.

A suposta ofensa à ampla defesa

Mas o aspecto que chama mais atenção na peça é o tópico V, em que o Ministério Público Federal afirma que a concessão do habeas corpus no caso violou o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.

  • Para o órgão, a autoridade coatora deve ser notificada para prestar informações e “justificar a prática do ato em relação ao qual se imputa ato ilegal ou com abuso de poder”. “Além disso, a autoridade coatora trará novos elementos aos autos, pois a instrução, até então, é pré-constituída pela defesa e UNILATERALMENTE (!!!) (SIC)”, diz o subprocurador que assina a petição.

  • Em seguida, ele diz ser obrigatória a abertura de vista ao Ministério Público sobre processos de habeas corpus antes da decisão, já que “o Ministério Público é o dominus litis; e deve agir, a um só tempo, como órgão acusador e fiscalizador da ordem jurídica”.

  • E conclui: “em síntese, a decisão recorrida, a um só tempo, (1) negou vigência ao contraditório e a ampla defesa, estabeleceu processo unilateral, sem a devida angularização, ao dispensar as informações da autoridade coatora, a qual se atribuiu a prática de ato ilegal ou com abuso de poder; (2) dispensou a manifestação do Ministério Público, órgão essencial à função jurisdicional e defensor da ordem jurídica, em ação constitucional e de natureza criminal”.

Todos os argumentos foram rebatidos pela Sexta Turma

O recurso ministerial foi negado pela Sexta Turma do STJ, que rebateu os argumentos. Veja:

  • Quanto à alegação de que o writ não deveria ter sido conhecido, tem-se que, “na hipótese do manejo do habeas corpus como substitutivo de recurso próprio, não há empecilho ao conhecimento do writ ou, ainda, à apreciação da questão de ofício, no caso de reconhecimento de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia, como na espécie, que prescinde o exame de provas ou de dilação fático-probatória.” (AgRg no HC n. 665.313/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 3/8/2021, DJe de 18/8/2021).

  • Ressalte-se que a competência do STJ para julgar o habeas corpus tem previsão expressa no art. 105, I, c, da Constituição Federal, o qual estabelece caber a esta Corte: “I – processar e julgar, originariamente: […] c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer das pessoas mencionadas na alínea “a”, ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;”

  • Ainda, nos termos do arts. 34, VIII e XX, do RISTJ, é atribuição do relator decidir liminarmente a pretensão contrária a tese fixada em julgamento de recurso repetitivo ou de repercussão geral, a entendimento firmado em incidente de assunção de competência, a súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou, ainda, a jurisprudência dominante acerca do tema.

  • Desse modo, as normas que prevêem a abertura de vista ao Parquet não obstam que o relator, em observância ao princípio da celeridade processual, julgue liminarmente a pretensão posta no writ quando o acórdão impugnado for manifestamente contrário à jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça.

  • Além disso, o pedido de informações é mera faculdade do relator do habeas corpus, conforme o disposto no art. 662 do CPP.

  • Não há, portanto, ofensa aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, tendo em vista a possibilidade de submissão do julgado ao exame do órgão colegiado, mediante a interposição de agravo regimental, após a devida intimação do Parquet.

Clique aqui para acessar o recurso do MPF.

Clique aqui para acessar o acórdão da Sexta Turma.

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